Documentar arquitetura de software sempre foi um desafio: ou é técnico demais e ninguém entende, ou superficial demais e inútil para o time. O C4 Model surgiu justamente para resolver esse problema, oferecendo uma abordagem visual, estruturada e incremental para descrever sistemas de forma clara.
Criado por Simon Brown, o C4 Model permite que arquitetos, desenvolvedores e stakeholders compartilhem uma visão comum sobre o sistema — independentemente do nível técnico de cada um. Ele é especialmente útil em ambientes ágeis, times distribuídos, ou sistemas complexos com múltiplos serviços e equipes.
O que é o C4 Model?
O C4 Model é uma forma de modelar a arquitetura de software em quatro níveis, cada um representando um “zoom” diferente do sistema:
- Contexto
- Contêineres
- Componentes
- Código
O nome vem das iniciais desses quatro níveis (C4 = Context, Containers, Components, Code). Essa estrutura ajuda a responder diferentes perguntas conforme o público-alvo e o nível de detalhe necessário.
Para entender como o C4 Model funciona na prática, vamos explorar cada um dos seus quatro níveis — Contexto, Contêineres, Componentes e Código — e aplicar esses conceitos em um cenário bastante conhecido: um sistema de e-commerce. A ideia é mostrar, de forma clara e progressiva, como o C4 ajuda a visualizar a arquitetura desse tipo de sistema desde a visão mais ampla até os detalhes técnicos. Cada diagrama será acompanhado de exemplos específicos para facilitar a compreensão, mesmo que você nunca tenha utilizado o C4 Model antes.
1. Diagrama de Contexto
Público-alvo: Todos, técnicos e não técnicos, dentro e fora da equipe de desenvolvimento de software.
Objetivo: Apresentar uma visão geral e acessível do sistema e suas interações externas.
O Diagrama de Contexto é o ponto de partida ideal para documentar e visualizar a arquitetura de um sistema. Ele oferece uma visão ampla e estratégica, colocando o sistema como um bloco central rodeado por pessoas (usuários, papéis, personas) e outros sistemas com os quais interage.
Nesse nível, detalhes técnicos não são relevantes. O foco está em mostrar o cenário geral, de forma que qualquer pessoa — técnica ou não — consiga entender rapidamente o papel do sistema e onde ele se encaixa no ecossistema.
Exemplo no e-commerce:
- No centro, temos o sistema de e-commerce.
- Ao redor temos:
- Usuários: consumidor final, operador logístico, administrador da loja
- Sistemas externos:
- Gateway de pagamento
- Plataforma de entregas
- Sistema ERP
Esse diagrama ajuda todos os envolvidos no projeto — inclusive pessoas não técnicas — a entenderem rapidamente quem usa o sistema e com quem ele se comunica, servindo como base para decisões estratégicas e técnicas futuras.
2. Diagrama de Contêineres
Público-alvo: Técnicos dentro e fora do time de desenvolvimento de software, incluindo arquitetos de software, desenvolvedores e equipe de operações/suporte.
Objetivo: Mostrar a estrutura de alto nível da arquitetura do sistema, seus contêineres e como eles se comunicam.
Depois de entender como o sistema se insere no ecossistema geral com o Diagrama de Contexto, o próximo passo é fazer um “zoom in” para dentro da fronteira do sistema. O Diagrama de Contêineres foca em mostrar as principais partes executáveis e implantáveis do sistema — chamadas de contêineres — além de como a responsabilidade está distribuída entre elas.
Um contêiner, nesse modelo, pode ser um aplicativo web, uma API, um app mobile, um banco de dados, um serviço de filas, entre outros — ou seja, unidades executáveis ou armazenadoras de dados que podem rodar de forma independente.
Exemplo no e-commerce:
Front-End Web – Aplicação que roda no navegador do cliente. Exibe o catálogo, carrinho, página de produto, checkout.
Aplicativo Mobile – Interface voltada para usuários móveis, conectando-se com a mesma API backend.
Backend API – Aplicação server-side que lida com regras de negócio, autenticação, pedidos, integração com sistemas externos (pagamento, entrega, ERP).
Banco de Dados (PostgreSQL) – Armazena informações estruturadas como usuários, pedidos, produtos, endereços, etc.
Painel de Administrador – Interface interna usada por administradores para gerenciar produtos, estoques, cupons e pedidos.
Serviços externos conectados:
- Gateway de pagamento
- API de frete
- Plataforma de ERP
O Diagrama de Contêineres ajuda a responder:
- Quais são as peças principais que compõem o sistema?
- Como elas se comunicam entre si?
- Que tecnologias estão sendo utilizadas?
3. Diagrama de Componentes
Público-alvo: Arquitetos de software e desenvolvedores.
Objetivo: Mostrar a divisão interna de um contêiner, elucidando quem faz o quê dentro daquele contêiner. Ele ajuda a comunicar as principais responsabilidades de cada componente e como eles colaboram para implementar as funcionalidades do contêiner. É útil para esclarecer as decisões de design de software (como a separação de preocupações em módulos/serviços) e facilitar o entendimento de como uma parte específica do sistema foi construída.
Espera-se um detalhamento maior do que no nível de contêiner. Cada componente interno deve ser identificado pelo seu papel / responsabilidade e normalmente também são indicadas as tecnologias ou implementações associadas (por exemplo: “Componente X – implementado em FastAPI, responsável por enviar e-mails”). O diagrama pode mostrar como os componentes se comunicam (chamadas internas de API, uso de bibliotecas, chamadas a banco de dados, mensagens, etc.) e que dados ou protocolos usam nessas interações.
Apesar do maior detalhe, ainda não estamos no nível de classe ou código fonte – um componente pode corresponder a um conjunto de classes, uma camada ou um módulo inteiro do sistema. O importante é não sobrecarregar o diagrama: costuma-se modelar apenas os componentes principais para manter a clareza (por exemplo, entre 5 e 10 componentes em um contêiner, dependendo da complexidade). Componentes muito pequenos ou triviais geralmente não aparecem; o foco está nos componentes significativos na arquitetura daquele contêiner.
Leia também: Como aplicar DDD em APIs com FastAPI de forma escalável
Observações: O diagrama de componentes aprofunda o zoom em relação ao diagrama de contêineres e se relaciona diretamente com ele – cada contêiner identificado no nível 2 pode ter um diagrama de componentes próprio no nível 3. Entretanto, nem sempre é necessário criar diagramas de componentes para todos os contêineres. Em sistemas simples ou quando a separação interna é óbvia, este nível pode ser pulado. Além disso, por apresentar mais detalhes, é fundamental mantê-lo atualizado conforme a base de código evolui; caso contrário, ele se torna obsoleto rapidamente. Algumas recomendações práticas indicam criar diagramas de componentes apenas se agregarem valor à documentação e, de preferência, automatizar sua geração para garantir uma documentação viva e sustentável.
Em resumo, use este nível de diagrama quando precisar comunicar como um contêiner funciona internamente e julgar que essa visão traz benefícios para a compreensão do sistema.
Exemplo dos componentes do back-end no e-commerce:
AuthService (Serviço de Autenticação) – Responsável pela autenticação de usuários e gerenciamento de sessões / token.
ProductCatalogService (Serviço de Catálogo de Produtos) – Gerencia os dados de produtos e estoque.
OrderService (Serviço de Pedidos) – Centraliza a lógica de processamento de pedidos.
PaymentService (Serviço de Pagamento) – Responsável por processar pagamentos dos pedidos.
NotificationService (Serviço de Notificações) – Cuida do envio de notificações ou comunicações ao usuário.
4. Diagrama de Código (Opcional)
Público-alvo: Desenvolvedores que trabalham diretamente no código-fonte.
Objetivo: Detalhar a estrutura interna de um componente específico — como classes, métodos e relações — para facilitar entendimento, refatoração ou onboarding técnico.
O Diagrama de Código é o nível mais granular do C4 Model. Ele mostra como um componente é implementado no código, revelando estruturas como classes, interfaces, métodos e relacionamentos entre elas. Esse nível é útil para treinar novos membros da equipe ou discutir melhorias/refatorações em módulos complexos.
Embora detalhado, esse diagrama não é obrigatório em todos os projetos. Ele deve ser utilizado quando houver valor claro em entender a implementação concreta de um componente.
Exemplo prático no e-commerce – componente OrderService:
- Classe OrderService
- createOrder(userId, items, paymentData)
- cancelOrder(orderId)
- getOrderById(orderId)
- Classe OrderValidator
- validateStock()
- validateCoupon()
- Classe OrderRepository
- save(order)
- findById(orderId)
Observações:
- Pode ser representado com UML ou gerado automaticamente por ferramentas como Lucidchart, draw.io, PlantUML, etc.
- Ideal para documentar componentes críticos ou facilitar a compreensão técnica em profundidade.
- Como mostra detalhes muito específicos, o ideal é manter esse nível sincronizado com o código-fonte ou gerado dinamicamente.
Conclusão
O C4 Model se destaca como uma abordagem moderna, visual e incremental para documentar arquiteturas de software com clareza. Ao dividir a arquitetura em quatro níveis — Contexto, Contêineres, Componentes e Código — ele permite que diferentes perfis do time (técnicos ou não) compreendam o sistema em camadas de profundidade adequadas.
Aplicando o modelo ao cenário de um e-commerce, conseguimos perceber como cada diagrama contribui para entender desde o ecossistema geral até os detalhes internos de um serviço crítico, como o de pedidos. Mais do que uma ferramenta de documentação, o C4 Model se torna um aliado na comunicação entre times, na tomada de decisões técnicas e no alinhamento com os objetivos do negócio.
Adotar essa abordagem reduz ambiguidades, facilita o onboarding de novos membros e traz mais confiança para evoluções no sistema. E o melhor: você pode começar com papel e caneta, ou usar ferramentas gratuitas como o draw.io e o PlantUML.
Quem é a Aquarela Analytics?
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Desenvolvedor Front-end na Aquarela Advanced Analytics. Cursando Ciência da Computação na UNIFACS (Salvador, BA).