A história do mercado de energia no Brasil remonta ao final do século XIX quando foram estabelecidas as bases para o desenvolvimento das primeiras usinas hidrelétricas. Ainda na primeira metade do século XX, surgiram as primeiras regulamentações referentes ao uso da água e ao domínio estatal sobre a energia elétrica.
Durante grande parte do século XX, o Estado detinha o monopólio absoluto da geração e da transmissão de energia elétrica. Era responsabilidade das empresas estatais planejar, construir e operar usinas hidrelétricas, além de fornecer energia aos consumidores finais por meio das redes de distribuição.
Entretanto, a partir de 1990, o setor de energia elétrica no Brasil passou por transformações com o intuito de introduzir mecanismos para melhorar a eficiência, qualidade e competitividade do setor elétrico.
Histórico do setor elétrico brasileiro
A Figura 1 destaca uma linha do tempo com alguns dos principais acontecimentos do setor elétrico até o processo de formação do Novo Modelo do Setor Elétrico, o qual se apoia em contratos como forma de induzir a expansão do sistema.
Estatização do setor elétrico
Conforme ilustrado na Figura 1, até o início da década de 1990, o setor elétrico brasileiro encontrava-se em um estágio de estatização. Havia uma forte política centralizadora, na qual o Estado apresentava amplo domínio sobre o setor.
As primeiras regulamentações chegaram com a criação do Código de Águas, em 1934, que transformou a relação do Estado com o setor de energia elétrica e definiu o controle estatal sobre os recursos hídricos. O Código de Águas regulamentou o uso da água no país, especialmente no setor de energia hidrelétrica.
Em 1939, foi criado o Conselho Nacional de Águas e Energia Elétrica (CNAEE). Esse foi o principal órgão do governo para o controle da utilização dos recursos hidráulicos e de energia elétrica no território nacional até a criação do Ministério de Minas e Energia (MME), em 1960, e da Eletrobrás, em 1962.
A Eletrobrás coordenava todas as empresas que compunham o segmento elétrico brasileiro. Até o final da década de 1970, a estatal promoveu um intenso processo de nacionalização e estatização por meio de investimentos financeiros expressivos no setor.
Entretanto, com a crise do petróleo da década de 1970 e a crise econômica enfrentada pelo Estado na década de 1980, o governo foi incapaz de sustentar o desenvolvimento e expansão do setor elétrico. Diante desse cenário, o modelo estatal passou a ser objeto de questionamentos.
Desestatização do setor elétrico
A partir da década de 90, iniciou-se a reestruturação do setor elétrico, marcando o início do processo de desestatização do segmento. Nesse período, surgiram algumas reformas econômicas dispostas a aumentar a eficiência e a competitividade no mercado. A ideia era que, no futuro, o Estado tivesse o papel de apenas regulador da atividade econômica do Brasil.
O Plano Nacional de Desestatização foi instituído no país em 1990. O programa tinha como objetivo implementar políticas de abertura do setor elétrico, dando início ao processo de privatização de empresas estatais e abertura dos setores econômicos à iniciativa privada. O propósito era estimular programas de investimento no setor elétrico e aumentar a eficiência das empresas de energia.
Um marco para o processo de privatização foi a promulgação da Lei das Concessões em 1995. Essa lei determinou que a concessão de serviços de energia elétrica fosse feita por meio de licitação pública, permitindo a participação de empresas privadas na prestação desses serviços, incluindo atividades de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica.
Ainda em 1995, foi criado o Mercado Atacadista de Energia (MAE). Esse órgão tinha o objetivo de ser um ambiente de negociação e contratação de energia elétrica entre agentes geradores e distribuidores.
No ano de 1996, houveram privatizações de empresas de energia elétrica importantes como a Light e a Cerj, além da criação da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). A ANEEL seria a entidade encarregada da regulamentação técnica e econômica, da supervisão e da mediação no âmbito do setor elétrico.
Apesar das primeiras mudanças para a reestruturação do setor de energia elétrica, a crescente demanda de energia elétrica não foi devidamente acompanhada pela capacidade de fornecimento, resultando na vulnerabilidade do sistema. Além disso, a ausência de um ambiente de livre contratação e a predominância de contratos de longo prazo com altas tarifas fixadas dificultavam a eficiência no setor comercial.
Diante desse cenário, houve a necessidade de uma reformulação do modelo do setor elétrico brasileiro, resultando na criação do Novo Modelo em 2003.
Novo Modelo do Setor Elétrico
O Novo Modelo do Setor Elétrico se baseia em contratos para induzir a expansão do sistema. Toda a demanda, tanto das distribuidoras quanto dos consumidores livres, deve ser integralmente suprida por meio de contratos de comercialização, sendo que cada contrato deve ser respaldado por energia assegurada. Isso garante que sempre haverá capacidade física de geração para suprir devidamente a expansão do mercado.
Para ingressar no mercado de comercialização de energia, é exigido que todas as entidades atuantes em geração, distribuição e comercialização sejam associadas à Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Há duas opções para comercialização de energia: o Ambiente de Contratação Livre (ACL) e o Ambiente de Contratação Regulado (ACR), conforme a Figura 2.
No ACR, a energia contratada pelas distribuidoras ocorre por meio de leilões promovidos pela ANEEL e operados pela CCEE.
Já no ACL, os contratos são negociados entre os agentes geradores, comercializadores e consumidores livres. Nesse ambiente, há liberdade na negociação do volume de compra e de venda de energia, bem como seus respectivos preços. Isso pode propiciar preços mais competitivos no mercado.
Os consumidores livres devem se enquadrar em uma das condições a seguir:
- Demanda igual ou superior a 3 MW e com tensão igual ou superior a 69 kV;
- Demanda igual ou superior a 500 kW, em qualquer faixa de tensão de fornecimento, desde que a energia adquirida seja proveniente de micro ou pequenas centrais hidrelétricas, ou de fontes renováveis como solar, eólica e biomassa.
Até o momento, apenas aqueles consumidores que apresentem demanda maior que pelo menos 500 kW podem participar do mercado livre de energia.
Todavia, a partir de 2024, qualquer unidade consumidora do grupo de A (tensão igual ou superior a 2,3 kV), independentemente de sua demanda contratada, poderá participar do ambiente de contratação livre.
Os agentes do mercado devem garantir que todos os seus contratos de venda sejam lastreados por contratos de compra ou garantia física de usinas. Além disso, o consumo deve ser respaldado por contratos de compra ou autoprodução de energia. Caso contrário, os agentes estão sujeitos a penalidades.
Conclusão – Da Centralização à Abertura: A Evolução Histórica do Setor Elétrico Brasileiro
Neste artigo foi apresentada a evolução histórica do setor elétrico brasileiro, o qual passou por diversas transformações ao longo dos anos.
Inicialmente marcado por uma forte política centralizadora, o Estado apresentava amplo domínio sobre todos os segmentos da energia elétrica, desde a geração até a transmissão e distribuição.
No entanto, as políticas de desestatização no final do século XX e início do século XXI apresentaram um papel importante na criação de um ambiente mais eficiente, culminando no novo modelo do setor elétrico de 2003, o qual incorpora os ambientes de contratação livre e regulada.
A evolução no setor elétrico trouxe consigo melhorias na eficiência do mercado, além de garantir o fornecimento de energia elétrica em consonância com a expansão do mercado.
Ademais, a possibilidade de negociação no mercado livre de energia proporcionou oportunidades para empresas e consumidores, estimulando a concorrência e diversificando as fontes de energia.
Quem é a Aquarela Analytics?
A Aquarela Analytics é vencedora do Prêmio CNI de Inovação e referência nacional na aplicação de Inteligência Artificial corporativa na indústria e em grandes empresas. Por meio da plataforma Vorteris, da metodologia DCM e o Canvas Analítico (Download e-book gratuito), atende clientes importantes, como: Embraer (aeroespacial), Scania, Mercedes-Benz, Grupo Randon (automotivo), SolarBR Coca-Cola (varejo alimentício), Hospital das Clínicas (saúde), NTS-Brasil (óleo e gás), Auren, SPIC Brasil (energia), Telefônica Vivo (telecomunicações), dentre outros.
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Autor
Engenheira Eletricista com ênfase em Eletrotécnica e Mestranda em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal de Campina Grande. Cientista de dados na Aquarela Analytics. Apresenta experiência na área de modelos de Machine Learning e Previsão de Séries Temporais.